- 05 de abril de 2019

Visão profissional – filme Amor

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“Amor” o filme vencedor do Festival de Cannes 2012 e do prêmio de melhor filme estrangeiro, o Oscar 2013,  desperta sempre emoção e reações admiráveis e surpreendentes. Uma delas é de grande visão profissional.

visao profissional  filme amor1O Hospital Alemão Oswaldo Cruz realizou no último dia 17 de maio um Workshop com o tema “Doenças crônicas terminais – suicídio de idosos” com base no filme francês Amor.

O evento foi promovido pela Diretoria Clínica e pela Comissão de Bioética do excelente Hospital Alemão Oswaldo Cruz em São Paulo, Capital. Os debatedores agendados foram os médicos Dr. Cássio Machado Bottino – coordenador do Projeto Terceira Idade do IPq HC FMUSP (PROTER) e do Centro de Referência em Distúrbios Cognitivos (CEREDIC); Dr. Omar Jaluul – coordenador médico do serviço de Geriatria do HC FMUSP e do Hospital Oswaldo Cruz e Dra. Mariângela Occhiuso, geriatra e do setor de Cuidados Paliativos do Hospital Oswaldo Cruz.

Entre os espectadores, ressaltou-se a participação nos excelentes debates após a exibição do filme, da Dra. Janise Lana Leite, médica geriatra.

Para todas as entidades, organizações e empresas que se preocupam com o envelhecimento populacional, transcrevemos na íntegra o teor dos aspectos comentados pela Dra. Janise:

Comentário sobre o filme Amor

Dra. Janise Lana Leite – médica geriatra

“As pessoas que assistiram ao filme francês Amor (L’Amour), do diretor Michael Haneke, foram levadas a refletir sobre o fim da vida. O filme nos apresenta um casal de idosos octogenários de classe média francesa, que tem uma filha casada e, aparentemente, poucos relacionamentos sociais. O grande evento que molda o destino do casal é um acidente vascular cerebral sofrido pela esposa.

O filme trata da questão do envelhecimento, mostrando a faceta da perda da independência da idosa. O esposo precisa auxiliá-la nos cuidados básicos de vida, como locomoção, higiene pessoal, vestir-se, preparar as refeições, além de estimular a reabilitação e propor opções de diversão e passagem do tempo.

O que mais me chamou a atenção no desenrolar do filme foi o isolamento social desse casal. Poucas visitas eles receberam, tanto da família, que consistia apenas da uma filha e do genro que moravam no exterior, quanto dos amigos. O atendimento de saúde foi indicado pelas visitas quinzenais de um médico, porém não foram representadas durante o filme. Quando o estado de saúde da idosa piora, o esposo contrata uma cuidadora.

O que se percebe é que o idoso luta, com seus recursos próprios, para oferecer o melhor para a sua esposa. E ele acredita fazer isso bem.  Porém, vai aos poucos se perdendo dentro de seu próprio mundo, esbarrando em suas limitações, e por isso, entrando em sofrimento psicológico e emocional. Esse sofrimento provavelmente leva-o a cometer o assassinato de sua esposa e o seu suicídio, que é o clímax da história.

O filme, até pelo seu título, nos leva a crer que o esposo faz isso por amor à sua companheira. Ao matá-la, liberta-a do sofrimento. Ao se matar, recusa-se a viver sem ela. Faço aqui minha análise como especialista em envelhecimento, trabalhando na área há algum tempo, de que muita coisa havia a ser feita por esse casal, de modo a evitar esse final dramático.

O idoso precisava de mais suporte social, de pessoas da família e da comunidade, seus vizinhos, pessoas da igreja e amigos, que o tirassem um pouco da rotina do cuidado. Ele precisava de mais tempo para cuidar de si, para que ele recarregasse as energias consumidas naquele cuidado. Deveria também ter contado com mais suporte de uma equipe de saúde multiprofissional, como psicólogo, fisioterapeuta e enfermeiro.

Assim, sua esposa teria sobrevivido mais um tempo, de todo modo não tão longo, pois sua condição já determinava uma sobrevida mais curta. Este senhor, por mais amor que tivesse por ela, teria se preparado para sua despedida. E quando ela se fosse, iria sofrer sua perda, no que chamamos de período de luto. Porém ele, aparentemente um homem saudável, continuaria sua jornada por essa vida. Muitas experiências, provavelmente, ainda tivesse pela frente.

Nossa luta diária é pela sobrevivência, em primeiro lugar, e em segundo,  por uma vida com qualidade. Quando perdemos a qualidade e quando o sofrimento, seja físico ou psicológico, é muito grande, a morte pode ser sim um desejo.  As diferenças culturais existem, porém, cada sociedade precisa se preparar para atender as demandas que estão surgindo com o envelhecimento populacional mundial.

Prolongar a vida, mas com qualidade.”

Germano Hansen Jr.

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