- 07 de abril de 2019

Sociedade perversa

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Personalidades notórias defendem a moral, a ética, os valores humanos e se apresentam como cavaleiros dos sentimentos mais nobres. Fato doloroso chocou o País no dia 28 de setembro de 2014. De quem é a culpa?

Transcrição da notícia publicada no UOL/Folha de São Paulo no dia 30 de setembro de 2014:

“Idoso mata a mulher em asilo e tenta se suicidar na zona leste de SP”

“Rafael Ribeiro, do Agora
30/09/2014  02h00

Um aposentado de 74 anos foi preso em flagrante após matar a mulher, de 72, com explosivos no asilo onde ela estava internada, no Parque São Lucas (zona leste de São Paulo), na tarde de domingo (28). Ferido, ele afirmou à polícia que seu objetivo era se suicidar com a mulher.

Segundo a polícia, Nelson e Neusa planejaram em conjunto a ação. O pedido teria sido feito por ela, internada no asilo há cerca de dois anos, desde que teve um AVC (Acidente Vascular Cerebral).

Em seu depoimento, Nelson disse que aceitou o pedido desde que morresse com a mulher. Revelou que preparou o plano sem contar aos quatro filhos.

Às 15h30 de domingo, o aposentado chegou para visitar Neusa, como fazia quase diariamente. Tirou de sua bolsa um explosivo feito com morteiros presos dentro de um cano de PVC, acendeu o pavio e a abraçou.

Funcionários do local acionaram a PM pensando se tratar de um tiroteio. Quando as equipes chegaram, encontraram os dois com ferimentos no tórax. Nelson tinha escrito uma carta explicando o caso.

O aposentado foi internado. Assim que receber alta, será indiciado por homicídio qualificado por uso de meio cruel e que coloca em risco a vida dos outros.

Segundo um vizinho, que não quis se identificar, Nelson chorava muito após a ida de Neusa para o asilo. Eles eram casados havia mais de 50 anos. A família não quis dar declarações.”
Chocante!

Capaz de abalar talvez simulacros de Hannibal, escritores de roteiros para filmes de terror ou séries policiais européias.

Entretanto é uma realidade. Um fato quase indescritível.

O aposentado será indiciado por homicídio qualificado por uso de meio cruel. Quem pode realmente saber e sentir o que se passou no coração desse homem apaixonado que não suportava a dor do sofrimento de sua amada de meio século de convivência.

Quem sabe a intensidade do amor que uniu esse casal?

Eles não tiveram a história contada em filme de grande sucesso como “Titanic” ou em centenas de películas e livros que falam do amor imaginado. Eles viveram a realidade de estarem juntos nos melhores momentos da vida. Casaram-se com menos de vinte anos na flor da juventude. Amaram-se e do amor nasceram quatro filhos. Devem ter lutado muito para criar os quatro. Com certeza atravessaram fases de alegrias e outras de dificuldades.

Numa época que proporcionou a mudança das convenções sociais, eles continuaram juntos, casados, vivendo a realidade menos glamorosa das décadas anteriores. Alcançaram a “bodas de ouro”, sonhada por milhares de noivos e conquistada por raros pares. Exigir que o sofrimento intenso fosse o prêmio pelo amor de toda uma vida é desconhecer a natureza e a estrutura emocional do que é o verdadeiro amor entre dois seres humanos. Assistir alguém desejar e pedir a morte é situação que só pode ser avaliada pelos dois seres humanos que se encontram nos pólos do pesadelo.

A vida deixa de ter sentido em meio a tanta dor, humilhação, constrangimento, tristeza e ausência de esperança. É fácil dizer: “não se desesperem”. Negado o direito de morrer, a grandeza do amor encontra um caminho, uma percepção de eliminação do mal por inteiro. O amor curtido pelas alegrias e tristezas vai à busca da sublimação: encontrar a morte como alternativa à degradação final, à deterioração insuportável do sentido da vida.

Ato de coragem suprema. Ilegal!Crime hediondo!

Milhões de VIPPES estão chegando. Milhares passarão pelos mesmos problemas que esse casal enamorado enfrentou. Como solucionarão as dificuldades?  Vão fazer cursos e treinamentos com psicólogos para superarem a tristeza e a depressão de conviverem com a dor, o sofrimento e a infelicidade? Como a sociedade vai enfrentar a longevidade que tem um preço muito alto na saúde do corpo, da mente e da alma?

O direito de morrer não existe. É tabu. E o que significa mesmo o direito de viver? De viver em que condições? Quem deve decidir pela vida de alguém? Quem deve decidir o grau de sofrimento e tortura física e mental que um ser humano pode aguentar?

O trágico fato do dia 28 de setembro não pode ser investigado apenas em uma delegacia de polícia. Precisa ser avaliado pela sociedade inteira. Pelos profissionais do direito, da saúde física e mental, pelos sociólogos, psicólogos e por todos aqueles que não se sintam felizes em esconder a realidade e verdade dos sentimentos humanos.

Haverá muito trabalho para muita gente. O pensamento crescerá vigoroso para encontrar caminhos menos espinhosos para as dificuldades da sociedade envelhecida.

G. Hansen Jr.

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